A massificação do ensino é coisa bastante recente, tanto no Brasil como
em outros países. Até a Segunda Guerra, só uma minoria ia à escola
e essa minoria vinha de lares de padrão econômico e cultural muito alto. Para
ela era fácil ensinar e quando surgiam dificuldades um professor particular
as resolvia. Para uma visão de maior alcance, vejamos alguns números,
referentes à Inglaterra
e correpondentes ao percentual da faixa etária que chegava até a
universidade:
No Brasil, apesar de sua precária democratização do acesso ao ensino, a explosão da demanda de vagas na escola já é uma preocupação das autoridades. O quadro abaixo mostra a demanda no ensino médio no Brasil recente, sendo que se deve acrescentar que a projeção da Secretaria de Eduacação Média do MEC é de que tenhamos um crescimento ainda maior, de 12% ao ano, de 2 000 até 2 002:
Uma primeira consequência desta massificação é a dificuldade de se conseguir professores habilitados, especialmente na área das ciências exatas. Contudo, nossa preocupação é com outra faceta da massificação. Ela vem fazendo que cheguem à escola alunos e professores cada vez menos capazes e com cada vez menor interesse acadêmico. Com eles, os métodos e padrões clássicos de ensino não mais funcionam. Examinemos isso usando o gráfico abaixo, o qual compara a evolução do desempenho dos alunos americanos no SAT ( =Scholastic Aptitude Test, que corresponde em natureza e finalidade ao nosso ENEM = Exame Nacional de Ensino Médio ) com o aumento nos gastos com ensino: O outro lado da moeda é a formação dos professores. O gráfico abaixo mostra o desempenho ( em nota de 0 a 10 ) dos formandos do Curso de Licenciatura da UFRGS nas questões objetivas de matemática de nível de ensino primário e secundário no Provão do MEC 1998. Sendo que este curso foi classificado pelo MEC como entre os melhores do país, só podemos ficar imaginando o que teria sido o desempenho dos outros cursos: Uma outra faceta da massificação é o aumento do valor econômico das atividades do sistema de ensino. Atualmente, o sistema de ensino brasileiro movimenta R$ 10 bilhões anuais; o ensino tornou-se um grande negócio, há muito livro, muito computador e muita software para vender e, assim, não é surpreendente que sofra grandes pressões, nem sempre bem intencionadas. São também enormes as pressões de cunho social e político, como a da aprovação praticamente automática, justificada com argumentos tipo "para não traumatizar o aluno" mas que, em verdade, são endossadas pelas autoridades para que produzam estatísticas que mascarem a real falta de democracia de nossa sociedade. Enfim, são várias as consequências da massificação, embora talvez possam ser resumidas pela rápida e brutal degradação social e intelectual do sistema de ensino. A UNESCO, em seu Relatório mundial sobre o ensino 1 998, já procura alertar que: o comportamento social do aluno representa um fator de preocupação crescente em vários países Um aspecto importante da degradação social denunciada pelo Relatório da UNESCO é a violência na escola, pois além da mesma afetar decisivamente a eficácia do aprendizado: ela vem transformando o professor em um guarda de disciplina. Note bem: esta violência não é apenas física! Torna-se comum os alunos de classe média tratarem seus professores, tipicamente de uma classe de poder aquisitivo menor, como se fossem seus subalternos, meros empregados que devem ouvir ordens e atender a seus desejos. Parte dessa indisciplina e inversão de valores é provocada pela insegurança e desmotivação do professor, seu despreparo e a irrealidade do currículo que tenta ensinar. Outra boa parte da violência corresponde ao denunciado pela UNESCO e resulta da perda de rumo ético da sociedade de consumo. Se, em casa, os pais já não conseguem dar exemplos de respeito, porque é que o pobre professor, em salas de aula abarrotadas de alunos, conseguirá? Essa confusão toda só tende a piorar com o surgimento de mil aproveitadores de ocasião tentando vender suas panacéias aos professores mal formados e à classe média transformada em consumidor desinformado. Afinal, como diz uma velha canção gauchesca: "a mentira sempre vem acompanhada de mil promessas". |
versão: 02 - mar - 2 000
local desta página: http://athena.mat.ufrgs.br/~portosil/polemica.html
© J.F. Porto da Silveira ( portosil@mat.ufrgs.br )
permitida a reprodução, desde que com fins acadêmicos e não comerciais