Mat01099 - Seminário Integrador III - UFRGS

Prof. João Batista Carvalho

Matrizes 2: Transformações, autovalores e diagonalização .

Ref.: David Luenberger. Introduction to Dynamic Systems: Theory, Models and Applications, John Wiley and Sons, Inc. New York, 1979.

Autovalores. Um escalar complexo $ \lambda$ é autovalor de uma matriz $A$ se existe um vetor não nulo $x$ (o autovetor associado a $ \lambda$) tal que $A x = \lambda x$. Todo autovetor associado a um autovalor real determina uma direção invariante da matriz.

Propriedades.

P1.
autovalores $ \lambda$ de uma matriz $A$ satisfazem a equação polinomial $p(\lambda) = det(A-\lambda I) = 0$;
P2.
uma matrix $A$ é singular se e somente se possui um autovalor $\lambda=0$;
P3.
autovetores associados a autovalores distintos são linearmente independentes;

Justificativas:

P1: $Ax = \lambda x \Leftrightarrow (A-\lambda I) x = 0$. Para que equação homogênea tenha solução não-nula, a matriz de coeficientes deve ser singular, isto é, deve ter determinante nulo. Além disso, pode-se mostrar que $det(A-\lambda I)$ é um polinômio de grau $n$ em $ \lambda$, onde $n$ é a ordem de $A$. Exemplos em Scilab e Maple.

P2: Se $A$ é singular: existe $x \neq 0$ tal que $A x = 0$, mas então $A x = \lambda x$, onde $\lambda=0$. Por outro lado, se $\lambda=0$ é autovalor, então existe $x \neq 0$ tal que $A x = 0$, o que implica que $A$ é singular.

P3: Supõe que temos $ A x_i = \lambda_i x_i$ onde os $\lambda_i$'s são distintos. Por contradição, supõe que temos, para algum $p > 2$:

$\{ x_1,x_2,\dots, x_p\}$ é linearmente dependente mas $\{x_1, x_2,\dots, x_{p-1}\}$ é linearmente independente.
Então $x_p$ é uma combinação linear de $x_1,x_2,\dots,x_{p-1}$: $x_p = a_1 x_1 + \dots + a_{p-1} x_{p-1}$. Além disso, como $\lambda_p$ é autovalor associado a $x_p$:
$\displaystyle 0 = (A - \lambda_p I ) x_p =
(A - \lambda_p I )(a_1 x_1 + a_2 x_2...
...2 (\lambda_2-\lambda_p) x_2 +
\dots + a_{p-1}(\lambda_{p-1}-\lambda_p) x_{p-1} $
e como, por hipótese, o conjunto $\{x_1, x_2,\dots, x_{p-1}\}$ é linearmente independente, temos $a_i (\lambda_i-\lambda_p) = 0, i=1,2,\dots, p-1$. Como os termos em parênteses nunca são iguais, deveremos ter $a_1 = a_2 = \dots = a_{p-1} = 0$, e então $x_p = 0$, o que contradiz o fato de $\lambda_p$ ser autovalor de $A$.

Dessa forma, não pode haver tal $p > 2$.

Mostraremos agora que $\{ x_1, x_2 \}$ é LI. Por contradição, se $x_2 = \mu x_1 $, então

$\displaystyle \left\{ \begin{array}{l}
A x_2 = A \mu x_1 \\
A x_2 = \lambda_2 ...
... x_1 = \lambda_2 x_1 \Leftrightarrow \lambda_1 = \lambda_2 \mbox{ ou }
x_1 = 0 $
contradição. Segue que $\{ x_1, x_2 \}$ é LI. Por indução, concluímos que $\{x_1, x_2, x_3\}$ é LI, e assim por diante.

Decomposição espectral. Se uma matriz $A$ possui um conjunto de autovetores $\{x_1,x_2,\dots, x_n\}$ linearmente independente, então para $\displaystyle X = \left[ \begin{array}{cccc}
x_1 & x_2 & \dots & x_n \end{array} \right] $, segue

$\displaystyle A \left[ \begin{array}{cccc}
x_1 & x_2 & \dots & x_n \end{array} ...
...\\
& \lambda_2 & & \\
& & \dots & \\
& & & \lambda_n \end{array} \right] $
e então $A X = X \Lambda$, e como $X$ é não-singular:
$A = X \Lambda X^{-1}$ (decomposição espectral)
ou ainda
$ X^{-1} A X = \Lambda$ (diagonalização).
Uma matriz $A$ que possui base de autovetores é portanto diagonalizável. Uma matriz $A$ que não possui base de autovetores (e como consequência não pode ser diagonalizada) é chamada de defeituosa (defective).

Consequências: Potências e funções analíticas de matrizes. Seja $A \in {\mathbb{R}}^{n \times n}$ uma matriz diagonalizável.

  1. $A^k = X \Lambda^k X^{-1} $, $k=1,2,3,\dots$. Dessa forma:
  2. potências de uma matriz $A$ diagonalizável convergem para a matriz nula se e somente se seus autovalores são todos interiores ao círculo unitário, no plano complexo. Exemplo: $A = \left[ \begin{array}{cc}
1 & -0.5 \\ 0.5 & 0.5 \end{array} \right]$, mostre que $A^{50}=
\left[ \begin{array}{cc}
0.0007525 & - 0.0007525 \\
0.0007525 & 0. \end{array} \right]$;
  3. Se ao menos 1 dos autovalores de uma matriz $A$ diagonalizável tiver magnitude maior do que 1, então a sequência $\{A^k\}$ é ilimitada ao $n$ crescer. Exemplo: $A = \left[ \begin{array}{cc}
0.5 & -0.5 \\ 0.5 & 0.9 \end{array} \right]$, mostre que $A^{20}=
\left[ \begin{array}{cc}
22.666613 & -33.479334 \\
-33.479334 & 49.45008
\end{array} \right]$.
  4. Se o autovalor de maior magnitude de uma matriz $A$ diagonalizável estiver na fronteira do círculo unitário ($\vert\lambda\vert=1$) então a sequência $\{A^k\}$ é limitada ao $n$ crescer, mas não converge para a matriz nula. Exemplo: $A = \left[ \begin{array}{cc}
\cos(\theta) & -\mbox{sen} \, (\theta) \\ \mbox{sen} \, (\theta) & \cos(\theta)
\end{array} \right]$, onde $\theta = \pi/3$ (grupo cíclico) ou $\theta = 1$ (grupo acíclico).



Joao Batista Carvalho 2014-05-01