Proporções


Temos aqui outro assunto crítico, onde nosso sistema de ensino tem se saído pessimamente. Sobre proporções, o conhecimento da vasta maioria das pessoas resume-se à aplicação mecânica da Regra de Três, nem sempre corretamente.
A situação é grave na medida em que a idéia de proporções, além de básica na Matemática, é essencial para o estudo de praticamente todas as disciplinas científicas.


1.- Variáveis diretamente proporcionais

Sendo uma variável numérica y função de uma outra variável numérica x, dizemos que y varia em proporção direta com x se sempre que dobrarmos x dobramos y, triplicarmos x triplicamos y, etc. Em termos mais precisos: a razão y / x tem sempre o mesmo valor para cada x e o correspondente y.

Vejamos a tradução algébrica disso: existe uma constante a ( não nula ) tal que podemos expressar a relação entre y   e   x como :

y = a x.


Tal constante a é chamada de constante de proporcionalidade de y em relação a x.

Geometricamente equivale a dizer que o gráfico cartesiano de y como função de x é uma linha reta passando pela origem.

EXERCICIO 1
Talvez a mais famosa lei da Física seja a Segunda Lei de Newton: F = m a, que relaciona a força, aceleração e massa de um corpo ( a força é expressa em newtons ( N ), a massa em Kg e a aceleração em metros por segundo ao quadrado ). Pergunta-se:


EXERCICIO 2
É bastante comum ser conveniente usarmos a notação y x para expressar que y varia em proporção direta com x.
Assim sendo, mostre que se y x   e se   x v , então y v .
Mostre isso tanto usando o raciocínio " dobrar, triplicar, etc " como através da caracterização algébrica acima.


EXERCICIO 3
Mostre que se y x , então a taxa média de variação de y em relação a x é sempre a mesma.
DICA : a taxa média de y entre x1 e x2 é
y2 - y1
x2 - x1


EXERCICIO 4


É comum ocorrer que y seja diretamente proporcional a   x2, ou seja valer y = a x2. É, então, natural que escrevamos y x2.
De um modo geral, ocorrendo que y seja diretamente proporcional a uma potência x b de x, ou seja valer y = a x b , escreveremos: y x b .
Pratiquemos um pouco com essa idéia:

EXERCICIO 5
RESPOSTAS: 20 h, $ 30 720

EXERCICIO 6
Para aves voadoras, deseja-se achar relação entre a tensão nas asas da ave e o peso da ave. Pede-se justificar o seguinte raciocínio de proporcionalidade:
Seja
L uma dimensão linear qualquer da ave ( por exemplo, seu comprimento ). Então:
tensão = ( peso da ave ) / ( area das suas asas ) L3 / L2 L . Por outro lado: peso massa volume L3.
Resumindo: tensão L e L peso 1 / 3 . A partir desses resultados, fica fácil concluir que: tensão peso 1 / 3 .


2.- A Regra de Três

A notação algébrica, que estamos acostumados a usar rotineiramente e que tanto simplifica o uso da Matemática, é uma invenção relativamente recente. Foi introduzida por François Viète, c. 1 600, e aperfeiçoada pelos cartesianos c. 1 650. Foi só a partir daí que passamos a usar fórmulas. Até então vivíamos na Era das Regras.

Uma regra não passa de uma receita para resolvermos um problema, enunciada em linguagem coloquial e com nenhum ou muito pouco simbolismo matemático. A Regra de Três é uma das poucas regras que sobreviveram na Era das Fórmulas. Ela foi descoberta por comerciantes indianos e um dos primeiros matemáticos a falar sobre ela foi o famoso Brahmagupta c. 500 dC. A partir daí, ela passou a ser presença obrigatória nos livros de aritmética orientais ( sendo chamada ora de Regra de Três ora de Regra de Ouro ) e acabou chegando no Mundo Cristão onde foi divulgada, principalmente, pelo famoso livro Summa do italiano Pacioli c. 1 500.

Antigamente, frequentemente, a Regra de Três era apresentada com uma justificativa misteriosa. Hoje, é fácil ver que resume-se a ser uma maneira complicada e ultrapassada de se trabalhar com proporções. Com efeito, sendo y = a x e supondo que para um valor x = x' conhecemos o respectivo y = y', para sabermos qual o y = y" associado com um dado x = x", é só usarmos que :

y'
x'
= a = y"
x"

e então resolver para y" em :
y'
x'
= y"

x"



EXERCICIO 7
Há problemas, como o do exercicío 1, em que a aplicação da Regra de Três é até ridícula. V. poderia dar um caracterização geral deles?


3.- Variáveis inversamente proporcionais

Sendo uma variável numérica y função de uma outra variável numérica x, dizemos que y varia em proporção INVERSA com x se sempre que dobrarmos x dividimos y ao meio, triplicarmos x dividimos y à terça parte, etc. Em termos mais precisos: o produto x . y tem sempre o mesmo valor para cada x e o correspondente y.

Vejamos a tradução algébrica disso: existe uma constante a ( não nula ) tal que podemos expressar a relação entre y   e   x como :

y = a / x.


Tal constante a é chamada de constante de proporcionalidade de y em relação a x. Frequentemente, pode ocorrer de não ser conveniente ou importante explicitarmos a, usa-se, então, a notação simplificada:
y 1 / x


Geometricamente, a proporcionalidade inversa equivale a dizer que o gráfico cartesiano de y como função de x é uma hipérbole "tangenciando" assintoticamente os eixos coordenados.

De um modo geral, ocorrendo que y seja INVERSAMENTE proporcional a   x b , ou seja valer   y = a / x b , escreveremos:
y 1 / x b


EXEMPLO
A força de atração gravitacional, F, entre duas massas é inversamente proporcional ao quadrado da distância d entre elas : F 1 / d 2 . Consequentemente, se dobrarmos a distância entre duas massas dadas, a força entre as mesmas será reduzida a um quarto do valor inicial; se triplicarmos a distáncia, a força ficará reduzida à nona parte de seu valor inicial; e assim por diante.


4.- Vamos praticar mais:



EXERCICIO 8
Foi construído um modelo em escala reduzida 1 : 50 de um navio. Sendo que a área molhada do casco do modelo é 35 cm2, qual a do navio?

Dadas duas figuras semelhantes, denotemos por L a variável que indica as dimensões lineares da primeira figura e por L' a que indica as da segunda. De modo análogo, denotemos por A e A' as variáveis indicando as áreas ( caso existam ) das duas figuras, e denotemos por V e V' os respectivos volumes.

Mostra a Geometria que temos: L L', A A' e V V'.

Ademais, sendo a a constante de proporcionalidade em L L', então as constantes de proporcionalidade para as áreas é a 2 e a dos volumes é a 3.

Temos, em óbvia notação: L = 50 l e daí A = 502 a, de modo que o caso a = 35cm2 corresponde a A = 87 500 cm2 = 8.75 m2.

EXERCICIO 9
Duas caldeiras industriais semelhantes tem área de 80 e 93 m2, respectivamente. Sendo que a segunda tem capacidade de 3 400 m3, qual a capacidade da primeira?
RESPOSTA: 2 712

EXERCICIO 10
A Mecânica dos Fluídos mostra que a resistência ao movimento de um navio é diretamente proporcional à área de sua secção transversal e diretamente proporcional ao quadrado de sua velocidade. A partir disso, pede-se relacionar as velocidades do navio do exerc. 8 e a de seu modelo.
DICAS: em óbvia notação, R A V2 e r a v2. Pelo semelhança dos navios, a constante de proporcionalidade é a mesma e daí :
V / v = 1 / 50 R / r





A segunda parte deste mini-curso trata da noção de proporcionalidade no caso de uma variável u que dependa de várias outras: x, y, z, etc. Situação essa que é classicamente denominada de proporções compostas. Para ir à essa segunda parte, click aqui.


fig


versão: 04-abr-2 002
localize esta página em: http://athena.mat.ufrgs.br/~portosil/matema.html

© 2002, por J.F. Porto da Silveira ( portosil@mat.ufrgs.br ).
Permitida a reprodução, desde que com fins acadêmicos e não comerciais.
Art. 299 do Código Penal Brasileiro ( Crime de Falsidade Ideológica ):
Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar ou nele fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser descrita.