Antonio Rodrigues |
a matemática no RGS até o Prof Rodrigues
Quando comparado com o dos outros países latino-americanos, o desenvolvimento da Matemática no Brasil foi muito tardio, e o do RGS iniciou ainda mais recentemente. Além de nosso estado estar afastado dos centros culturais do país, sua condição de fronteira meridional do Brasil dificultou e atrasou ainda mais sua evolução cultural e científica em geral. Com efeito, não seria exagero resumirmos a história do RGS, até c. 1950, como dividida em 200 anos de guerras de fronteiras e 100 anos de não menos dolorosas guerras civis. Além da falta de um ambiente adequado para os estudos e pesquisas, temos de levar em conta as enormes perdas humanas e materiais que isso acarretou.
A matemática de nível superior só passou a ser estudada no RGS com a criação da Escola de Engenharia de Porto Alegre, em 1 896, hoje Escola de Engenharia da UFRGS. Os primeiros professores de matemática dessa Escola tinham a formação matemática da Escola Militar, sediada no Rio de Janeiro. Isso equivale a dizer que, além de ser uma matemática limitada pelos interesses práticos e profissionais da, naquela época, incipiente engenharia em nosso estado, era uma matemática que seguia a linha positivista.
Em outras biografias, já tivemos oportunidade de enfatizar que o positivismo foi muito prejudicial ao desenvolvimento da Matemática: empunha delimitações exageradas ( por exemplo: não aceitava as idéias probabilistas, negava a validade de várias noções básicas da Análise Matemática, etc ), dava uma orientação mais metafísica do que científica aos estudos e desconhecia os desenvolvimentos matemáticos do final do sec. XIX e início do sec. XX.
No Brasil, a reação contra o Positivismo acelerou-se nas duas primeiras décadas do sec XX sendo que sua derrota foi simbolicamente declarada em 1 925, com a vinda de Einstein ao Brasil: com a mesma, o Brasil dizia ao mundo reconhecer a Ciência Moderna recebendo aqui, com todas as honras, seu maior expoente. Mas, a construção brasileira dessa Ciência Moderna iniciou só a partir de 1 930, com a fundação da Universidade de São Paulo ( USP ). Com a criação do Curso de Matemática na Faculdade de Ciências e Letras da USP, e os das outras faculdades de Filosofia que logo passaram a ser fundadas pelo resto do Brasil, deixou-se definitivamente de lado a orientação positivista e passou-se a trabalhar na linha das melhores universidade européias da época, tanto no ensino como na pesquisa.
sobre a formação matemática do Prof Rodrigues
O Prof. Antonio Rodrigues na qualidade de um dos primeiros egressos do Curso de Matemática da Faculdade de Filosofia da USP, foi um dos primeiros brasileiros a receber uma formação moderna em Matemática.
Mas há mais do que isso. Na época da fundação da USP, dado o domínio da escola militar-positivista no Brasil, a direção da universidade teve de buscar professores de matemática em universidades européias, principalmente em universidades italianas. Esses professores lecionaram na USP durante alguns anos e formaram professores brasileiros que tomaram seu lugar quando retornaram à Europa. O Prof. Antonio Rodrigues ainda pode usufruir da orientação desses eminentes italianos, seja no convívio acadêmico diário, seja na realização de cursos. Assim, por exemplo, fêz um curso de dois anos de Geometria Projetiva com o Prof. G. Albanese, um dos mais importantes e famosos geômetras do início do sec. XX.
O Prof. Rodrigues também preza muito os estudos que realizou no IMPA. Nessa instituição teve a oportunidade e o prazer de fazer cursos com os maiores nomes da matemática brasileira do sec XX: Leopoldo Nachbin, Maurício Peixoto e Paulo Ribenboim. Foi no IMPA que ele pode ir além da formação mais para clássica dada pelos italianos e iniciar uma caminhada de muitos anos estudando Álgebra Abstrata, Topologia e seus assuntos prediletos: Geometria Diferencial e Variedades Riemannianas, sendo que nesses dois últimos campos foi orientado por Elon Lages Lima, Jacob Pallis e Manfredo P. do Carmo. Seus contatos com o IMPA ocorreram por muitos anos e duraram até sua aposentadoria, sendo de se ressaltar que costumava passar suas férias de verão no Rio de Janeiro para poder acompanhar os cursos e seminários desenvolvidos naquela instituição.
sobre a atuação profissional do Prof Rodrigues
- professor modernizador
O prof Rodrigues chegou a Porto Alegre em 1944, tornando-se o primeiro catedrático de Geometria da incipiente Faculdade de Filosofia da UFRGS. Naquela época, a matemática conhecida e ensinada aqui no RGS ainda era a oriunda das antigas escolas de engenharia, o que vale dizer que era a matemática positivista cultuada nas escolas militares do sec. XIX, cujo atraso e precariedade já apontamos acima. Tendo constatado essa realidade, o Prof. Rodrigues, demonstrando vocação de verdadeiro professor, tomou em seus ombros a tarefa de introduzir em nosso meio disciplinas básicas da matemática atual, várias das quais nunca nem mesmo havíamos ouvido falar: Álgebra Abstrata, Topologia, Álgebra Linear, Geometria Projetiva, etc. Ele também muito modernizou os conteúdos de Análise Matemática e Geometria Diferencial. Essa enorme tarefa foi feita através de cursos que ele mesmo deu e através de seminários de estudos de livros hoje clássicos, como: Birkhoff-MacLane ( Álgebra Moderna ), Jacobson ( Álgebra Moderna ), Bourbaki ( Topologia ), etc, etc.
- construção do Instituto de Matemática da UFRGS
O Prof. Rodrigues foi um dos criadores do IM da UFRGS e um de seus primeiros diretores. Nessa oportunidade, o Prof Rodrigues deu os primeiros passos no sentido de dotar essa instituição com uma biblioteca de qualidade e de uma equipe básica de pesquisadores.
Esse trabalho de pioneiro não foi nada fácil: a falta de recursos materiais e humanos eram gigantescos obstáculos. O Prof Rodrigues nos confidenciou que uma vez chegou a cogitar de pedir o fechamento do IM, mas acabou concluindo que "se a terra é árida e inculta, deve ser protegida e adubada para que mais tarde possa vir a produzir". O Tempo mostrou que ele tomara a decisão correta.
- construção do Instituto de Matemática da UF Santa Catarina
No período de 1 964 a 1 968, o Prof. Rodrigues colaborou decisivamente na construção do Instituto de Matemática e do Curso de Matemática da, então incipiente, Universidade Federal de Sta. Catarina. Durante esses anos, ele ia semanalmente até Florianopólis para lá lecionar cursos de Álgebra Moderna, Geometria Diferencial, Fundamentos da Matemática e Geometria Analítica.
- escritor de livros didáticos
Em ordem a viabilizar seu trabalho de professor catedrático do Curso de Matemática da Faculdade de Filosofia da UFRGS, dentro da linha modernizadora a que se propusera, o Prof Rodrigues acabou escrevendo inúmeros livros e notas de cursos. Esse material serviu para introduzir e divulgar as várias disciplinas matemáticas que já apontamos acima, sendo que alguns de seus livros foram por muitos anos adotados como livros-texto em vários cursos de nossa universidade, tendo sido objeto de estudo por milhares de alunos. Entre seus mais conhecidos e usados livros, podemos citar:
- Curso de Geometria Diferencial, em 2 vol., publicados pelo IM da UFRGS em 1959 e 1961
- Curso de Geometria Analítica, em 3 vol., Editora Meridional, 1963-65
- professor orientador
uma outra obra importante do Prof Rodrigues foi a orientação e/ou encaminhamento dos alunos talentosos que se formavam no Curso de Matemática ou no Curso de Engenharia. Naquela época os estudos de pós-graduação em matemática no Brasil eram muito pouco divulgados entre os alunos da UFRGS. O Prof Rodrigues costumava encaminhar esses alunos para cursos de nivelamento no IMPA ( corresponderia a um muito bom mestrado atual ), seguidos de um doutorado no exterior. Isso foi o que ocorreu com Pedro Nowosad, Silvio Machado, João Bosco Prolla, etc.
Homenagem do IM da UFRGS ao Prof Rodrigues
O Conselho do Instituto de Matemática da UFRGS, em sua reunião de 07 de agosto de 2003, homologou a escolha do nome do Prof. Rodrigues para batizar a biblioteca desse instituto.
BIBLIOGRAFIA
Para uma reconstrução de primeira mão sobre o ambiente matemático dos primeiros tempos do Curso de Matemática e do Instituto de Matemática da UFRGS, pode-se consultar o seguinte fascículo:
Antonio Rodrigues - Reminiscências de um ex-diretor: um depoimento de memória.
Cadernos do IM-UFRGS, série C, No. 15, 1991. Porto Alegre, RGS, Brasil.
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